Parece ficção científica, mas não é. Portugal prepara-se para dar um passo sem precedentes na mudança do paradigma dos transportes: acabar com a forte dependência dos carros a gasolina e a gasóleo – um dos maiores pesadelos da factura energética nacional.
A solução, inspirada no modelo israelita, passa por um acordo entre o Executivo de José Sócrates e o construtor automóvel Renault-Nissan, o primeiro a propor a produção de carros eléctricos em massa. “Os carros para o Projecto Better Place deverão ser produzidos em França, e será criada uma gama totalmente eléctrica”, diz fonte da Renault Portugal. Os ministros da Economia e do Ambiente, Manuel Pinho e Nunes Correia, receberam recentemente o convite de Carlos Tavares, vice-presidente da Nissan, para lançar este conceito em Portugal. E não hesitaram.
O sucesso do projecto, que deverá arrancar dentro de três ou quatro anos, está condicionado pela criação de uma estrutura logística em larga escala. O Governo sabe disso e está já a montar um consórcio que envolve um vasto leque de entidades públicas e privadas. É o caso do Centro de Inteligência e Inovação (Inteli), detido em 75% pelo Estado, da Câmara de Lisboa e de empresas como a EDP, Galp, Martifer, Brisa, Sonae e Jerónimo Martins. À lista irão juntar-se ainda diversos grupos económicos ligados ao sector tecnológico. Fonte oficial da Renault Portugal não adianta pormenores, mas confirma que “Portugal faz parte dos países para implementar o projecto Better Place”.
Fechado a sete chaves, os contornos definitivos do modelo de negócio serão brevemente anunciados com pompa e circunstância pelo Executivo de José Sócrates. Um projecto que faz parte do pólo de competitividade para o sector automóvel que Manuel Pinho anunciou estar a criar.
Com esta viragem de paradigma, diz um especialista do sector “garantidamente vão aparecer novas fábricas para produzir outros tipos de carros em Portugal que estarão perto de centros de testes e de competência”. Neste novo ciclo da indústria, além dos fornecedores de componentes já existentes, vamos ter os da electrónica e renováveis. “Que hipóteses temos: eléctrica, biotenol, hidrogénio? Há muito por definir, mas é importante começar a andar. Estamos a falar de uma reconversão da indústria automóvel”, adianta esta fonte.
O rosto da mudança é o israelita Shai Agassi, que chega com provas dadas. Em Janeiro, o primeiro-ministro de Israel, Shimon Perez, surpreendeu o mundo ao aderir ao Project Better Place, comprometendo-se a substituir centenas de milhar de veículos poluentes por carros amigos do ambiente. E acima de tudo reduzir drasticamente a sua dependência do petróleo em dez anos. Mas o que parece uma utopia, há muito que despertou o apetite de diversos agentes económicos. Sobretudo dos grupos energéticos, que vêem no projecto uma nova oportunidade e sabem que se ficarem de fora arriscam-se a perder dinheiro.
A EDP trabalha, há meses, num projecto conjunto com os gigantes energéticos europeus EDF, RWE e Endesa no desenvolvimento do projecto ‘Grid for Vehicle’ (G4V), iniciativa que visa verificar os impactos da ligação dos carros eléctricos à rede pública. Este é um passo considerado crucial para a implementação de toda a logística, a par dos avanços nas baterias de lítio – que já garantem autonomias na ordem dos 150 quilómetros. Na forja estão ainda sistemas de tecnologia complementares que permitem carregamentos rápidos de 80% da carga das baterias, em apenas dez minutos.
Agilizar o abastecimento será, aliás, crucial, para o sucesso da operação. E é aqui que a Galp entra. A petrolífera, que controla 37% do mercado de distribuição de combustíveis e uma rede de mais de 800 postos de combustíveis em todo o país, quer ter um papel a dizer neste processo.
Em cima da mesa está a montagem de postos eléctricos nas suas bombas, bem como de sistemas de substituição de baterias. Garantem os especialistas contactados pelo DE, que estes últimos demoram, em média, cerca de quatro minutos. Ou seja, o cidadão comum pode optar por vários tipos de carregamentos. Um lento, que na prática consiste em fazê-lo na sua própria casa, o que poderá demorar cerca de seis horas, e um mais rápido, recorrendo aos pontos de abastecimentos disponíveis na cidade – que poderão ir desde os vulgares parques de estacionamento aos centros comerciais. Daí a importância de atrair para o negócio os grandes grupos de distribuição
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