Esta história merece ser aqui reproduzida!!!:
O caso do homem que se safou por não ter fôlego para soprar
Ora toma lá disto!
Conclusão: o mundo é dos espertos e não dos sérios, honestos e cumpridores. Depois admiram-se de isto andar como anda...
O caso do homem que se safou por não ter fôlego para soprar
por Sílvia Caneco, Publicado em 16 de Julho de 2011
Fernando José Custódio foi apanhado a conduzir aos esses. Estaria bêbado? Não se sabe, porque, segundo os agentes, desobedeceu e não soprou o suficiente no balão. Seria batoteiro? Ou seria asmático?
Um homem sem força para soprar pode ter problemas. Ou atenuantes. Às vezes um simples advérbio de modo pode fazer a diferença, pelo menos numa sala de audiências.
"Estaria o arguido verdadeiramente embriagado, ou apenas aparentemente embriagado?", questiona o defensor oficioso, de pé, depois de apresentar as "saudações" aos presentes.
Do arguido não ouviremos uma palavra. Nem conheceremos a sua cara, ou a sua sombra. Apenas um nome: Fernando José Custódio. Sobre ele falará Amílcar, o agente da PSP que jura por sua honra só o conhecer "de uma noite". O arguido não apareceu, nem justificou a falta. Mesmo assim será julgado, na sua ausência.
Os agentes seguiam no carro da PSP na Avenida dos Combatentes, em Lisboa, quando avistaram uma viatura a andar aos esses. Fernando Custódio, o condutor, só viria a parar, por ordem dos agentes, quilómetros à frente. Interpelado para fazer o teste do álcool, fingiu-se prestável. Mas depois, segundo o agente Amílcar, começou a fazer batota, pois nem as bochechas enchia para soprar.
"Ele fazia que ia assoprando, mas parava o sopro."
"Parava como?", questiona a juíza.
"Não soprava o sopro suficiente."
"Ele alguma vez disse que não conseguia soprar?"
O agente exemplifica com uma onomatopeia difícil de reproduzir:
"Ele só fazia ffffeeeeee..."
Imagine uma criança sem força para encher um balão, o ar a ir-se embora e o balão a desmaiar. Imagine esse som, é mais ou menos isso que o agente Amílcar insiste em copiar para exemplificar as manhas do réu ausente.
"Era só fffeeee e parava de soprar."
"Mas ele fazia isso convictamente?", interroga o advogado de defesa. "Não seria asmático?"
Questão pertinente: uma crise de asma retiraria a força a um homem para soprar no balão. É sempre um bom argumento para invocar. É como dizer que alguém é louco ou tem uma psicose qualquer: sem exames médicos é impossível de comprovar.
"Estaria mesmo embriagado? Os testes foram insuficientes porque não houve uma colaboração activa ou havia alguma impossibilidade física?", insiste o advogado, pedindo que, perante a dúvida, se absolva o arguido. Chega a ser comovente ver um oficioso defender com tamanha dedicação um réu que nem sequer pôs um pé em tribunal.
Só sobra Amílcar para responder, mas a avaliar pelo extenso interrogatório ninguém parece acreditar na força de autoridade, que ali está só na condição de testemunha.
"Disseram-lhe que se ele não soprasse estaria a incorrer num crime de desobediência?", pergunta a juíza.
"Sim, mas ele respondia que nós é que devíamos soprar. Até nos disse... posso dizer exactamente o que nos disse?"
Silêncio.
"Disse: ''Vocês são uma m€rda. Uma pessoa vem do trabalho, bebeu uns canecos e vocês vêm-nos lixar a vida.''"
"E ofereceram-lhe a possibilidade de fazer contraprova no hospital?"
"Ele recusou, não fazia nada nem deixava fazer, nem quis assinar o auto de detenção. Só sabemos o nome porque vimos os documentos. Para o final já estava melhorzinho, mas também tivemos mais de duas horas com o homem."
O procurador recupera a importância de um advérbio de modo.
"O arguido estava aparentemente embriagado, não sabemos se estava verdadeiramente embriagado, porque não quis fazer o teste. Não se conhecem antecedentes ao arguido, por isso pede-se pena de multa."
Fernando Custódio é acusado do crime de desobediência, não do de condução com excesso de álcool, porque isso o alcoolímetro não conseguiu provar. Recebe uma pena de 60 dias de multa: terá de pagar somente 360 euros. E diz-se somente porque aqui o advérbio também importa. Antes dele, outro homem apanhado a conduzir com excesso de álcool - que obedeceu e apareceu em tribunal - foi condenado a 600 euros de multa e proibição de conduzir durante dez meses.() Ser desobediente compensa. Ter um advogado que se lembra de invocar uma doença respiratória também.
por Sílvia Caneco, Publicado em 16 de Julho de 2011
Fernando José Custódio foi apanhado a conduzir aos esses. Estaria bêbado? Não se sabe, porque, segundo os agentes, desobedeceu e não soprou o suficiente no balão. Seria batoteiro? Ou seria asmático?
Um homem sem força para soprar pode ter problemas. Ou atenuantes. Às vezes um simples advérbio de modo pode fazer a diferença, pelo menos numa sala de audiências.
"Estaria o arguido verdadeiramente embriagado, ou apenas aparentemente embriagado?", questiona o defensor oficioso, de pé, depois de apresentar as "saudações" aos presentes.
Do arguido não ouviremos uma palavra. Nem conheceremos a sua cara, ou a sua sombra. Apenas um nome: Fernando José Custódio. Sobre ele falará Amílcar, o agente da PSP que jura por sua honra só o conhecer "de uma noite". O arguido não apareceu, nem justificou a falta. Mesmo assim será julgado, na sua ausência.
Os agentes seguiam no carro da PSP na Avenida dos Combatentes, em Lisboa, quando avistaram uma viatura a andar aos esses. Fernando Custódio, o condutor, só viria a parar, por ordem dos agentes, quilómetros à frente. Interpelado para fazer o teste do álcool, fingiu-se prestável. Mas depois, segundo o agente Amílcar, começou a fazer batota, pois nem as bochechas enchia para soprar.
"Ele fazia que ia assoprando, mas parava o sopro."
"Parava como?", questiona a juíza.
"Não soprava o sopro suficiente."
"Ele alguma vez disse que não conseguia soprar?"
O agente exemplifica com uma onomatopeia difícil de reproduzir:
"Ele só fazia ffffeeeeee..."
Imagine uma criança sem força para encher um balão, o ar a ir-se embora e o balão a desmaiar. Imagine esse som, é mais ou menos isso que o agente Amílcar insiste em copiar para exemplificar as manhas do réu ausente.
"Era só fffeeee e parava de soprar."
"Mas ele fazia isso convictamente?", interroga o advogado de defesa. "Não seria asmático?"
Questão pertinente: uma crise de asma retiraria a força a um homem para soprar no balão. É sempre um bom argumento para invocar. É como dizer que alguém é louco ou tem uma psicose qualquer: sem exames médicos é impossível de comprovar.
"Estaria mesmo embriagado? Os testes foram insuficientes porque não houve uma colaboração activa ou havia alguma impossibilidade física?", insiste o advogado, pedindo que, perante a dúvida, se absolva o arguido. Chega a ser comovente ver um oficioso defender com tamanha dedicação um réu que nem sequer pôs um pé em tribunal.
Só sobra Amílcar para responder, mas a avaliar pelo extenso interrogatório ninguém parece acreditar na força de autoridade, que ali está só na condição de testemunha.
"Disseram-lhe que se ele não soprasse estaria a incorrer num crime de desobediência?", pergunta a juíza.
"Sim, mas ele respondia que nós é que devíamos soprar. Até nos disse... posso dizer exactamente o que nos disse?"
Silêncio.
"Disse: ''Vocês são uma m€rda. Uma pessoa vem do trabalho, bebeu uns canecos e vocês vêm-nos lixar a vida.''"
"E ofereceram-lhe a possibilidade de fazer contraprova no hospital?"
"Ele recusou, não fazia nada nem deixava fazer, nem quis assinar o auto de detenção. Só sabemos o nome porque vimos os documentos. Para o final já estava melhorzinho, mas também tivemos mais de duas horas com o homem."
O procurador recupera a importância de um advérbio de modo.
"O arguido estava aparentemente embriagado, não sabemos se estava verdadeiramente embriagado, porque não quis fazer o teste. Não se conhecem antecedentes ao arguido, por isso pede-se pena de multa."
Fernando Custódio é acusado do crime de desobediência, não do de condução com excesso de álcool, porque isso o alcoolímetro não conseguiu provar. Recebe uma pena de 60 dias de multa: terá de pagar somente 360 euros. E diz-se somente porque aqui o advérbio também importa. Antes dele, outro homem apanhado a conduzir com excesso de álcool - que obedeceu e apareceu em tribunal - foi condenado a 600 euros de multa e proibição de conduzir durante dez meses.() Ser desobediente compensa. Ter um advogado que se lembra de invocar uma doença respiratória também.
Ora toma lá disto!
Conclusão: o mundo é dos espertos e não dos sérios, honestos e cumpridores. Depois admiram-se de isto andar como anda...
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