Os inquilinos da Câmara de Lisboa têm sobejas razões para estar satisfeitos com o seu senhorio: a lista do património disperso da autarquia, a que o CM teve acesso, deixa claro que em 4222 casas, lojas e ateliês cedidos pela autarquia alfacinha, por cedência e arrendamento habitacional e não habitacional, 83 por cento têm aplicadas rendas mensais de valor inferior a 50 euros e 29 por cento contam mesmo com uma renda inferior a cinco euros por mês.
Ao longo de centenas de páginas, a lista do património disperso da autarquia alfacinha é um autêntico manual de desactualização de rendas em espaços residenciais e comerciais. E há valores de toda a ordem de grandeza: desde um mínimo de 25 cêntimos, passando por dezenas e dezenas de um e dois euros, inúmeros 30 e 40 euros, poucos números acima de 100 euros, até atingir o caso único de 1191 euros de um arrendamento comercial nas Escadinhas de Santo Estêvão.
O documento, que se refere a 2005, é diferente da listagem distribuída pelo presidente da autarquia, António Costa, na passada quarta- -feira, aos vereadores do PSD. Por isso, até a presidência da Câmara de Lisboa divulgar a nova lista do património disperso, o documento, a que o CM teve acesso, permite obter uma radiografia fiel do modo como o património camarário tem sido gerido nos últimos anos. E isto em matéria de rendas mas também na forma pouco transparente como a autarquia tem atribuído as suas casas e outros espaços a funcionários camarários, artistas e figuras públicas, como é o caso do jornalista Baptista- -Bastos, do ex-deputado do PS Fernando Ka e do ex-seleccionador de futebol Ruy Seabra.
Para já, inúmeras casas e lojas situadas em zonas nobres da capital, como a Lapa, São Bento e Graça, pagam autênticas pechinchas de renda mensal. Por exemplo, o Colégio de São João de Brito, um dos mais prestigiados de Lisboa, paga, segundo a lista em causa, 50 cêntimos de renda por mês. E uma loja de cristais da Marinha Grande, instalada junto ao jardim da Assembleia da República, gasta com a renda mensal 25,33 euros.
Monteiro de Barros, presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), não fica estupefacto com as rendas: "Rendas a cinco euros e 50 euros não me surpreendem, porque nós temos essas rendas cá na Associação." À luz desta realidade, Monteiro de Barros não tem dúvidas de que "as rendas baixas distorcem o mercado do arrendamento em Lisboa". E desde logo porque "tudo o que sejam preços artificiais, impostos ou facultados vai destruir o mercado".
Helena Roseta, o mais recém-aliado de António Costa na autarquia, é categórica: "As rendas actuais são completamente antiquadas." Com a responsabilidade política de elaborar o novo Plano de Habitação para Lisboa, a ex-deputada do PS não tem dúvidas de que "o património da Câmara precisa de uma reforma de fundo". Mais: "Como os critérios de atribuição não são claros e não foram públicos", Roseta defende que "todo o património deve ser cedido por concurso público e os [diferentes] regimes devem ser unificados". Para já, "esta situação choca-me. Mas não a entendo, porque isto arrasta-se desde antes do 25 de Abril".
José Sá Fernandes, vereador dos Espaços Verdes, não podia ser mais esclarecedor sobre a actual situação: "Fiquei completamente boquiaberto com as rendas baixíssimas." Para contornar esta situação, diz que "a autarquia tem de avaliar caso a caso, verificar se a pessoa tem ou não direito à casa, e, se tiver, fixar uma renda justa".
O gabinete de António Costa já fez saber que os serviços estão a rever as situações onde existem as chamadas rendas técnicas, estabelecidas em função do valor da escritura das casas, e garante que vai avançar com novos regulamentos para esta área. E frisa mesmo que "este executivo da Câmara Municipal de Lisboa não atribuiu nenhuma casa fora do âmbito da habitação social e, mesmo estas, foram atribuídas por proposta fundamentada dos serviços e não discricionariamente pelo presidente ou pela vereadora".
Ruben Carvalho, vereador sem pelouro do PCP, não tem dúvidas de que, nas últimas décadas, "a autarquia não tem feito uma boa gestão do seu património". E frisa, para salvaguardar as diferenças nos vários tipos de situações do património camarário, que "o património disperso da Câmara chegou à autarquia das formas mais diversas, desde heranças, até ao prédio que resultou de contrapartidas". O problema, diz, é que "nunca houve um critério coerente e transparente".
José Eduardo Macedo, presidente da Associação dos Profissionais de Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), não podia ser mais contundente: "fica-se sempre com a sensação de que temos um País e dois sistemas: os que andam à mama do orçamento e os que pagam o orçamento". Por isso, considera que "a Câmara de Lisboa tem o problema financeiro resolvido se aplicar rendas justas aos seus inquilinos".
O ESSENCIAL DA LISTA
A lista a que o CM teve acesso reúne dados sobre vários tipos de património. Para avaliar a realidade nas áreas essenciais, considerou-se as casas e lojas de cedência habitacional e não habitacional e arrendamento habitacional. Lista tem dados sobre habitação social.
NÚMEROS DE FOGOS DO PATRIMÓNIO DISPERSO
Cedência habitacional: 829
Arrendamento habitacional: 1870
Cedência não habitacional: 1523
Total: 4222
NÚMEROS DAS RENDAS COM VALOR INFERIOR A 50 EUROS
Cedência habitacional: 828
Arrendamento habitacional: 1750
Cedência não habitacional: 819
Total: 3497 (83% do total)
NÚMEROS DAS RENDAS COM VALOR INFERIOR A 5 EUROS
Cedência habitacional: 778
Arrendamento habitacional: 244
Cedência não habitacional: 222
Total: 1244 (29% do total)
281 CASAS CEDIDAS COM SOARES
Os mandatos de João Soares, entre 1995 e 2001, foram aqueles em que foram cedidas mais casas do património disperso da autarquia lisboeta no pós-25 de Abril, segundo a lista de atribuição de habitações. Nos mandatos de Soares, foram cedidas 281 casas, seguindo-se a presidência de Krus Abecassis (1979-1989) onde foram atribuídas 200 habitações. Com Pedro Santana Lopes foram cedidos 155 fogos, mais dois do que no mandato de Jorge Sampaio, entre 1989 e 1995). O mandato de Carmona Rodrigues atribuiu 112 casas.
in CM
Ao longo de centenas de páginas, a lista do património disperso da autarquia alfacinha é um autêntico manual de desactualização de rendas em espaços residenciais e comerciais. E há valores de toda a ordem de grandeza: desde um mínimo de 25 cêntimos, passando por dezenas e dezenas de um e dois euros, inúmeros 30 e 40 euros, poucos números acima de 100 euros, até atingir o caso único de 1191 euros de um arrendamento comercial nas Escadinhas de Santo Estêvão.
O documento, que se refere a 2005, é diferente da listagem distribuída pelo presidente da autarquia, António Costa, na passada quarta- -feira, aos vereadores do PSD. Por isso, até a presidência da Câmara de Lisboa divulgar a nova lista do património disperso, o documento, a que o CM teve acesso, permite obter uma radiografia fiel do modo como o património camarário tem sido gerido nos últimos anos. E isto em matéria de rendas mas também na forma pouco transparente como a autarquia tem atribuído as suas casas e outros espaços a funcionários camarários, artistas e figuras públicas, como é o caso do jornalista Baptista- -Bastos, do ex-deputado do PS Fernando Ka e do ex-seleccionador de futebol Ruy Seabra.
Para já, inúmeras casas e lojas situadas em zonas nobres da capital, como a Lapa, São Bento e Graça, pagam autênticas pechinchas de renda mensal. Por exemplo, o Colégio de São João de Brito, um dos mais prestigiados de Lisboa, paga, segundo a lista em causa, 50 cêntimos de renda por mês. E uma loja de cristais da Marinha Grande, instalada junto ao jardim da Assembleia da República, gasta com a renda mensal 25,33 euros.
Monteiro de Barros, presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), não fica estupefacto com as rendas: "Rendas a cinco euros e 50 euros não me surpreendem, porque nós temos essas rendas cá na Associação." À luz desta realidade, Monteiro de Barros não tem dúvidas de que "as rendas baixas distorcem o mercado do arrendamento em Lisboa". E desde logo porque "tudo o que sejam preços artificiais, impostos ou facultados vai destruir o mercado".
Helena Roseta, o mais recém-aliado de António Costa na autarquia, é categórica: "As rendas actuais são completamente antiquadas." Com a responsabilidade política de elaborar o novo Plano de Habitação para Lisboa, a ex-deputada do PS não tem dúvidas de que "o património da Câmara precisa de uma reforma de fundo". Mais: "Como os critérios de atribuição não são claros e não foram públicos", Roseta defende que "todo o património deve ser cedido por concurso público e os [diferentes] regimes devem ser unificados". Para já, "esta situação choca-me. Mas não a entendo, porque isto arrasta-se desde antes do 25 de Abril".
José Sá Fernandes, vereador dos Espaços Verdes, não podia ser mais esclarecedor sobre a actual situação: "Fiquei completamente boquiaberto com as rendas baixíssimas." Para contornar esta situação, diz que "a autarquia tem de avaliar caso a caso, verificar se a pessoa tem ou não direito à casa, e, se tiver, fixar uma renda justa".
O gabinete de António Costa já fez saber que os serviços estão a rever as situações onde existem as chamadas rendas técnicas, estabelecidas em função do valor da escritura das casas, e garante que vai avançar com novos regulamentos para esta área. E frisa mesmo que "este executivo da Câmara Municipal de Lisboa não atribuiu nenhuma casa fora do âmbito da habitação social e, mesmo estas, foram atribuídas por proposta fundamentada dos serviços e não discricionariamente pelo presidente ou pela vereadora".
Ruben Carvalho, vereador sem pelouro do PCP, não tem dúvidas de que, nas últimas décadas, "a autarquia não tem feito uma boa gestão do seu património". E frisa, para salvaguardar as diferenças nos vários tipos de situações do património camarário, que "o património disperso da Câmara chegou à autarquia das formas mais diversas, desde heranças, até ao prédio que resultou de contrapartidas". O problema, diz, é que "nunca houve um critério coerente e transparente".
José Eduardo Macedo, presidente da Associação dos Profissionais de Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), não podia ser mais contundente: "fica-se sempre com a sensação de que temos um País e dois sistemas: os que andam à mama do orçamento e os que pagam o orçamento". Por isso, considera que "a Câmara de Lisboa tem o problema financeiro resolvido se aplicar rendas justas aos seus inquilinos".
O ESSENCIAL DA LISTA
A lista a que o CM teve acesso reúne dados sobre vários tipos de património. Para avaliar a realidade nas áreas essenciais, considerou-se as casas e lojas de cedência habitacional e não habitacional e arrendamento habitacional. Lista tem dados sobre habitação social.
NÚMEROS DE FOGOS DO PATRIMÓNIO DISPERSO
Cedência habitacional: 829
Arrendamento habitacional: 1870
Cedência não habitacional: 1523
Total: 4222
NÚMEROS DAS RENDAS COM VALOR INFERIOR A 50 EUROS
Cedência habitacional: 828
Arrendamento habitacional: 1750
Cedência não habitacional: 819
Total: 3497 (83% do total)
NÚMEROS DAS RENDAS COM VALOR INFERIOR A 5 EUROS
Cedência habitacional: 778
Arrendamento habitacional: 244
Cedência não habitacional: 222
Total: 1244 (29% do total)
281 CASAS CEDIDAS COM SOARES
Os mandatos de João Soares, entre 1995 e 2001, foram aqueles em que foram cedidas mais casas do património disperso da autarquia lisboeta no pós-25 de Abril, segundo a lista de atribuição de habitações. Nos mandatos de Soares, foram cedidas 281 casas, seguindo-se a presidência de Krus Abecassis (1979-1989) onde foram atribuídas 200 habitações. Com Pedro Santana Lopes foram cedidos 155 fogos, mais dois do que no mandato de Jorge Sampaio, entre 1989 e 1995). O mandato de Carmona Rodrigues atribuiu 112 casas.
in CM
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