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Tem mesmo a certeza de que nos dias de hoje existe um governo em portugal?

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    [Política] Tem mesmo a certeza de que nos dias de hoje existe um governo em portugal?

    Se eu fosse a si não teria. Não me refiro a alguma agitação dos ministros, a algum despacho que saia daqueles edifícios, à actividade dos assessores de imprensa, ao fluxo perene de dinheiros e subsídios para mil e um beneficiados. Mas alguém sabe o que fazem a maioria dos ministros face aos problemas dos seus sectores? Sabe-se do ministro do Trabalho, justiça lhe seja feita, e mais um ou dois ministros. Mas a Educação está bloqueada, o Ambiente não existe, a Cultura ninguém se lembraria que é um ministério, se não fosse Manuel Maria Carrilho lembrar que o devia ser. O ministro da Administração Interna vai chegar ao termo das suas funções sem perceber que não é ministro da Justiça, e sem perceber o significado da palavra segurança. O ministro da Justiça nem sequer preside a um ajuntamento de corporações em guerra umas com as outras, porque nem o lugar de presidente da mesa lhe deram. O Ministro das Finanças, um dos pilares fundamentais deste Governo e que podia apresentar obra, assiste agora à demolição quotidiana do que tinha conseguido com pretexto na crise, e, como já o admitiu, governa pelas estrelas.

    Há um governante que trabalha muito. O ministro dos Assuntos Parlamentares, que tutela a televisão, a rádio e a propaganda. No seu ministério e no gabinete do primeiro-ministro, trabalha-se 24 horas por dia e em todos os azimutes. Seria, aliás, interessante saber se um blogue anónimo “corporativo” feito por assessores usando arquivos governamentais e que tem o objectivo de popularizar os temas da propaganda, fazer contrapropaganda e desinformação bastante profissionalizada, se bem que sem grande sucesso, depende desse ministro ou do gabinete do primeiro-ministro. Aí trabalha-se em tempo quase real, mas governar só residualmente. No Governo está tudo em estado de estupor. Estudar os assuntos, identificar e resolver os problemas, implementar um programa, fazer qualquer coisinha por um país que está numa profunda, muito profunda crise, não se usa nem se pratica. A culpa salvífica é da “crise”, que é tratada como uma desculpa útil e pouco mais.

    Há dois dias aconteceu mais um exemplo daquilo que digo. Liga-se a televisão e lá vem o habitual “momento Chávez” quotidiano do primeiro-ministro. Já toda a gente percebeu que o primeiro-ministro incorpora todos os dias na sua agenda um pretexto para um comício de três ou quatro minutos no prime time televisivo, que tem como objectivo ou a propaganda directa de si próprio ou do seu Governo, ou uma resposta às críticas da oposição. Todos os dias, insisto, todos os dias, a narrativa da propaganda governamental desenrola-se aos nossos olhos como se fosse uma notícia, quando é apenas um puro tempo de antena. Se estivéssemos num país em que a comunicação social se regesse por critérios jornalísticos, como não há qualquer conteúdo informativo, o primeiro-ministro ficaria a falar para os seus convidados de casting. Ou, pior ainda, as suas declarações seriam tratadas no âmbito do puro conflito político e seguidas de uma resposta nos mesmos termos noticiosos da oposição.


    Mas cá, estes “momentos Chávez” são tratados como matéria informativa e noticiosa e passados com reverência, em particular pela RTP. Por isso, a malfeitoria e o abuso são recompensados. Por isso, todos os dias o staff do primeiro-ministro prepara-lhe uma TV opportunity, porque já não estamos em tempo de photo opportunities. São precisas imagens em movimento, luz e cor. E como para o primeiro-ministro esta é a verdadeira “saída para a crise”, ele desloca-se onde for preciso, gasta o tempo que for preciso, apenas para aparecer às oito horas num telejornal, fresco e desempoeirado, a anunciar coisa nenhuma, a fazer coisa nenhuma, a não ser propaganda. Propaganda que todos pagamos e muito caro, através dos nossos impostos.

    Se fizermos uma antologia destes “momentos Chávez”, e um dia ela será feita, percebe-se muito bem a montagem, a cuidada preparação da colocação do homem, o vestuário, a voz e o discurso, o sítio onde são permitidas as câmaras, o controlo absoluto do cenário para que não haja qualquer interrupção, qualquer incomodidade, qualquer pergunta impertinente que estrague o objectivo do acto de propaganda. É por isso que a meia dúzia de manifestantes da CGTP à entrada perturbam tanto o primeiro-ministro. Escolhe-se as montanhas bravias sobre os vales dos rios que serão destruídos, para falar das barragens, as máquinas de uma fábrica para falar dos subsídios à indústria. Prepara-se uns powerpoints, ou, melhor ainda, uns filmes com efeitos especiais de computador para que se reforce a imagem positiva do que se anuncia, como se tudo já estivesse feito. As televisões obedientes e acríticas passam-nos, apesar de serem puro tempo de antena. Ninguém se questiona. Jornalistas formados numa escola de espectáculo e marketing acham normal passar propaganda em vez de darem notícias.

    Não vemos se a barragem existe, ou se o estaleiro já está avançado, não vemos se a fábrica está a laborar em pleno, ou se os operários vivem de um peculiar subsídio de desemprego a que se chama “formação”, não vemos quase nada, porque não há nada para ver. Os anúncios de boca cheia sucedem-
    -se uns aos outros, os prazos são sempre para amanhã, os beneficiários envolvidos são sempre milhares, mas não conta para nada que os anúncios não passem de anúncios - a energia das ondas está em terra, avariada, tudo indica que, definitivamente; as minas de Aljustrel, que já deviam estar a laborar, promessa e prazo do primeiro-ministro, não se sabe quando começam a fazê-lo; a Qimonda já estava salva nas respostas bélicas e arrogantes no Parlamento, mas está fechada; o aeroporto da Ota já tinha um filme com os aviões a levantar do Oeste, mas não há aeroporto nenhum, não é no Oeste, nenhum avião de lá levantou e ainda nada começou; os telespectadores já viram a alta velocidade a voar sobre carris, e um filme do tipo da Guerra das Estrelas (ou será a Toy Story?) com os comboios moderníssimos a entrar em estações mais ou menos espaciais. Espreme-se e sai quase nada de um governo que teve excepcionais condições para fazer obra.


    Quando uma coisa não corre bem, é rapidamente esquecida para que apenas a memória das boas imagens subsista intacta. O Magalhães começou a dar problemas, acabaram as sessões de entregas e avançou o silêncio. Qualquer pessoa conhecedora dos problemas do nosso ensino, das nossas escolas, da pedagogia no ensino básico, da nossa condição social, do tipo de problemas de manutenção e do ritmo da renovação tecnológica sabe do enorme desperdício que é o programa Um Aluno Um Computador naquelas idades e com aquelas ideias num ambiente de completa impreparação. Sabe que a maioria dos computadores distribuídos está longe, muito longe, de ter servido para qualquer dos objectivos pretendidos, porque à cabeça todo o programa era desadaptado, foi feito em cima do joelho para servir a propaganda governativa, e, daqui a um ano, tudo já estará obsoleto ou avariado. O dumping de um computador do Terceiro Mundo para um país europeu, que é o que significou o Classmate transformado em Magalhães, talvez permita vender os restos à Líbia ou à Venezuela, mas neste último caso já se percebeu que será quase a fundo perdido. Silêncio.

    É por isso que poucas coisas revelam mais esta ausência de governação no meio de um crise gravíssima do que um primeiro-ministro que mais uma vez foi à Central Fotovoltaica da Amareleja, a pretexto de uma visita de estudantes estrangeiros numa iniciativa paga pelo próprio Governo (o ministro da Economia considerou má educação querer saber quanto custou), e que funcionaram como casting para a sua aparição diária na televisão. Como é óbvio, falou em português para estudantes que não percebem a língua, mesmo sendo suposto haver tradução. Mas não era para eles que falava, era para nós. Era o “momento Chávez” de dia. Aquilo a que hoje se resume a governação. Historiador
    Pacheco Pereira in publico
    Editado pela última vez por sirmister; 14 April 2009, 01:27. Razão: formatação

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