O professor universitário e CEO da YDreams defende que é preciso promover a imagem do País de forma inteligente.
António Câmara, professor universitário e CEO da YDreams, é um criativo por excelência. Sobressaiu na ciência e no mundo empresarial, foi distinguido com o Prémio Pessoa. Mas também poderia ter sido conhecido pelo ténis, uma outra paixão que possui, que quase o levou a enveredar por uma carreira profissional. Em entrevista ao Etv, no "Conversas com Vida", considera que há uma diferença entre a má imagem, de país falido, que o resto do mundo tem de Portugal, e o valor real da nação. "Somos muito melhores do que parecemos mas, nesta altura, as aparências, de facto, não perdoam", reconhece. Admite que Portugal está numa encruzilhada e pode transformar-se numa espécie de Itália do Sul, com elevados índices de criminalidade. Se Portugal não der a volta por cima acredita que pode regredir 20 anos e assistir a uma saída em massa dos talentos, até porque os investidores estrangeiros não estão a investir em Portugal.
A actual conjuntura de Portugal entristece-o?
Entristece-me profundamente. Limita-nos, a nós e a todas as empresas portuguesas. Muitas das coisas que estávamos a fazer e a sonhar para Portugal ainda hoje achamos que podiam ter um enorme impacto. Portugal é um país que tem uma enorme riqueza, sobretudo a nível do talento nacional. Hoje, quando estamos a ir para o exterior, essencialmente, estamos a deslocalizar esse talento - como acontece com a YDreams -, por exemplo, para o Brasil. Tínhamos o sonho de um projecto para o estuário do Tejo, que o iria transformar numa zona de referência, a nível mundial. Estivemos envolvidos num projecto para o Museu da Língua, que poderia ter um enorme impacto em Lisboa e muitos outros projectos que tivemos de abandonar.
Isso sob o ponto de vista da empresa...
Da actividade operacional.
E sob o ponto de vista conjuntural?
Esta é uma situação é muito complicada. Antigamente ninguém sabia onde era Portugal. Hoje todos sabem onde é, mas a nossa imagem é péssima.
E isso paga-se caro...
E isso paga-se. É extraordinariamente difícil. Saíram artigos muito graves sobre Portugal a dizer que éramos uma ‘Nation Drop Out'. Obviamente que pode ter havido erros em Portugal, mas é uma situação largamente injusta. Apesar de tudo, somos muito melhor do que parecemos mas, nesta altura, as aparências, de facto, não perdoam.
Neste momento já não dependemos apenas de nós próprios.
Não, Portugal deixou de ser independente. Portugal, hoje em dia, é totalmente dependente.
Vamos perder a independência durante muito tempo?
Entrámos numa espiral negativa perigosíssima. Tínhamos várias empresas. Ainda temos algumas empresas notáveis. Algumas com enorme potencial. Mas, neste momento, a maior parte dessas empresas enfrenta enormes dificuldades. Porque não há investimento em Portugal e, os investidores estrangeiros, pura e simplesmente, não investem em empresas portuguesas. Na Bolsa alemã durante algum tempo a nossa cotação desceu porque, pura e simplesmente, esta é uma empresa de um país falido. Portanto, paga-se extraordinariamente caro. Está-se a queimar um trabalho de anos. Vamos recuar 20 ou 30 anos na criação de uma nova economia. Para além disso, hoje em dia, a juventude não tem, de facto, as colocações que são razoáveis para a formação que tem.
E vão partir?
Ainda não se regista. Podemos dizer que ainda é em pequenas percentagens mas vai aumentar largamente. Veja-se, por exemplo, o anúncio da chanceler alemã, Angela Merkel, a dizer que tem 500 mil vagas. Basicamente, todos os nossos estudantes de engenharia, poderão, eventualmente, ir para fora. E, de facto, estamos numa situação, extremamente triste e perigosa em relação ao futuro. Houve uma fase, nos anos noventa, em que estivemos numa espiral positiva e agora, estamos numa negativa. É extraordinariamente difícil ultrapassá-la quando o nosso financiamento não depende de nós.
Mas se realmente não conseguirmos ultrapassar essa espiral negativa vamos regredir? Que país vamos ser?
Há dois cenários. Há este que é regredirmos significativamente e transformarmo-nos - esperemos que não - num país com o teor criminal de uma Itália do Sul. O outro é não conseguirmos captar investidores. Esse tem sido o nosso esforço a nível individual. Estou certo que muitas empresas portuguesas, nas áreas baseadas no conhecimento, estão a procurar investidores estrangeiros. Apesar de tudo temos conseguido. É isso que nos permite ter esperança. É extraordinariamente difícil mas...
É possível?
Apesar de tudo, é possível. E essa é a saída. Neste momento, tem de haver, também, uma promoção da imagem de Portugal de forma muito mais inteligente do que a que foi feita até aqui.
Como conseguem cativar, agora, os investidores estrangeiros?
O investidor estrangeiro só investe se provarmos... Nos Estados Unidos, hoje em dia, só investem se a empresa tiver um potencial para valer mil milhões de dólares.
O mercado americano é extraordinariamente difícil?
Sim. O mercado alemão é mais fácil e passa sempre pela colocação na Bolsa, o que é um passo arriscado na situação em que a maior parte das empresas está. Levámos para a Bolsa uma empresa que ainda não tinha vendas - ainda não tem, mas vai ter - mas, têm de ser empresas que tenham uma inovação com um potencial explosivo.
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