Governo diz que utilizador vai pagar uso das estradas
O Secretário de Estado Paulo Campos explica, em entrevista, como vai viabilizar financeiramente a nova Estradas de Portugal. E o que ele e Mário lino esperam do mercado.
Martim Avillez Figueiredo
Ninguém está a perceber o novo modelo de financiamento da Estradas de Portugal, mas toda a gente percebe que o passivo salta para este novo contrato sem que ninguém o pague...
...Não é assim. A Estradas de Portugal gere um conjunto de activos por conta e ordem do Estado e operações associadas à sua missão. Os contratos de concessão de auto-estradas que hoje existem são feitos directamente pelo Estado e pelos concessionários – não pela Estradas de Portugal. Isso significa que o passivo associado a estes contratos é um passivo assumido pela Estradas de Portugal em nome do Estado.
Pois, mas no final é dinheiro que terá de ser pago por alguém. Por quem?
Esse é o ponto chave – a mudança que transfere o financiamento do contribuinte para o utilizador. E isso implica encontrar um novo modelo de gestão que assuma essas falhas que foram geradas até agora...
...Não estou a perceber. O que estão a transferir então do Estado para a Estradas de Portugal? Apenas as novas estradas que virão um dia a ser construídas?
Estamos a transferir tudo o que não está ainda concessionado. A rede actual de estradas e a rede futura de estradas...
...Então, quem paga o défice actual é o Estado?
Não. O que estou a dizer é que se transferem, mediante pagamento de rendas, activos actuais e futuros para a Estradas de Portugal. E que será justamente de uma combinação da geração de receitas actuais e da rentabilização dos activos futuros que terão de ser pagas as responsabilidades presentes e futuras. O Estado não vai assumir qualquer défice ou passivo – vai dizer à Estradas de Portugal que use todos os activos que lhe são entregues para pagar as responsabilidades actuais e futuras, nomeadamente aos concessionários.
Espere aí. O que está a dizer é que a Estradas de Portugal receberá do Estado português o direito futuro sobre todas as concessões que hoje existem (portanto apenas no momento em que essas concessões em vigor terminarem) e, claro, receberão ainda todas as receitas que essas concessões geram – bem como as receitas das novas concessões de estradas que ainda não existem. E que esse dinheiro (baseado em futuros) terá de servir para fazer face a todas as despesas actuais e futuras.
Isso. A Estradas de Portugal vai pagando já as contas de exploração dos contratos feitos pelo Estado com base nos activos actuais e naqueles que receberá no futuro. Isto é, o Estado entrega--lhe todos esses activos (que ela só poderá gerir no futuro) mas, em troca, assume a responsabilidade de pagar os actuais compromissos do Estado e todos os seus compromissos futuros.
Com que dinheiro fará isso?
Qualquer contrato de infra-estruturas é deficitário no início e, nesse contexto, existirão défices de financiamento durante algum tempo. Mas a empresa tem ao seu dispor as receitas da contribuição do serviço rodoviário, as receitas de portagens. Assim, a pouco e pouco, o saldo equilibrar-se-á e a empresa irá gerar os meios necessários para fazer face ao endividamento.
É o Estado que assegura esse financiamento?
Não. E não o fará nem via dívida, nem disponibilizando-se para ser avalista dos empréstimos. O Estado concessiona os activos às Estradas de Portugal, e estas rentabilizam-nos para avalizar todo esse esforço de financiamento.
Será essa nova empresa a decidir (de acordo com essas necessidades financeiras) se uma estrada tem ou não portagens?
Não. Que fique muito claro: decisões sobre portagens são da exclusiva responsabilidade do Governo. Bem como decisões sobre que novas estradas devem ser construídas. Mas as portagens que já existem e as que resultem de novas auto-estradas já representam um montante elevado de receitas. A adicionar às portagens das três SCUT e à contribuição do serviço rodoviário. Parece um problema financeiro muito complexo, mas não é.
Mas as portagens nas SCUT estão atrasadas. E se não aparecem essas receitas?
Não quisemos fechar nenhuma negociação antes de ter o modelo concluído. Agora está fechado, e isso era fundamental para concluir as negociações.
Há quem diga que não existe espaço nas auto-estradas para construir portagens...
...Mas não haverá de forma generalizada praças de portagens nas SCUT. Já o dissemos antes: serão sistemas de portagem virtuais...
Pois, mas que não apanham todos os carros e ...
...Oiça, isso está tudo testado e implementado em muitos países. Será uma tecnologia semelhante a ser aplicada aqui. E ninguém será obrigado a escolher um agente de cobrança, porque vamos disponibilizar outros modelos de pagamento – por exemplo, os pré-pagos...
Resumindo, a Estradas de Portugal terá de ser muito eficaz na gestão financeira de recursos existentes e futuros. Terá de ter magos do ‘project finance’. Já têm equipa para isto?
Elegeremos um novo conselho de administração capaz de responder a todos esses desafios...
... Não é o actual...
A decisão será tomada em assembleia geral, nos próximos dias.
Mas já sabem que perfil de pessoas procuram?
Já. Uma equipa que interprete bem esta missão – que é a gestão muito eficaz e moderna de contratos de concessão, e não a de regulação das estradas. Profissionais muito eficazes na gestão de contratos, portanto, engenheiros, gestores financeiros e gestores justamente de contratos.
Essa equipa existe em Portugal ou pode vir de fora?
Pode vir, mas há muitos bons gestores em Portugal. Não nos parece necessário ir lá fora buscar ninguém, até porque este modelo é muito inovador. É uma revolução na gestão do sector em Portugal...
...É o modelo do utilizador-pagador.
Exactamente. Paga através das estradas com portagens e, das que não têm, via contribuição rodoviária. Acaba-se com a ideia perversa de todos pagarem estradas que apenas alguns utilizam.
Parece o modelo do Governo de Santana Lopes, em que António Mexia ocupava o lugar de Mário Lino...
Não, esse modelo só introduzia portagens nas SCUT. Este faz muito mais – é uma reforma profunda. A nova empresa torna-se profissional na gestão de projectos e concessões. Não tem outras responsabilidades. E isso vai permitir-lhe impor boas práticas e gerar muito mais dinâmica de mercado, porque pode ir ao mercado para um mesmo activo mais do que uma vez.
Portanto é um modelo de mercado exclusivo para as auto-estradas. E as velhinhas estradas nacionais, quem paga?
Essa é a outra novidade. Podem ser feitos contratos de concessão também para essas estradas. Sempre sem portagens, mas tornando mais eficiente a sua gestão. Impondo níveis de serviço, por exemplo, ou de diminuição de sinistralidade, o que estimula o mercado a apresentar as melhores soluções, assumindo o mercado os riscos de não cumprimento dos níveis contratualizados .
O novo modelo
- Governo concessiona rede rodoviária nacional – auto-estradas, intinerários principal e complementares e estradas nacionais – à Estradas de Portugal
- Estradas de Portugal passa hoje a ser uma empresa S.A. de capitais exclusivamente públicos e com um capital social de 200 milhões de euros.
- Empresa financiar-se-à através das receitas de portagens, do imposto sobre o combustível e do recurso ao endividamento.
- Prazo de concessão está fixado nos 92 anos, ou seja, até 2099.
- Estradas de Portugal passam a ser responsáveis pelo lançamento dos concursos que podem ser realizados em PPP.
EDIT: faltava a fonte da notícia
http://diarioeconomico.sapo.pt/edici...o/1056954.html
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