O P. Arroja foi processado porque chamou ao Rangel advogado incompetente e de vão de escada e entretanto escreveu os 2 post que se seguem que não sendo propriamente uma novidade deveria ser uma coisa mais discutida, para ver se se acabava com este conflito de interesses entre advogados e a politica..
dois verdadeiros fascistas
Maio de 1965, governava então Salazar. Um crítico chega à televisão e diz que um alto dignitário do regime então vigente é um politiqueiro e um jurista de vão-de-escada.
No dia seguinte, o crítico tinha um processo-crime por difamação. O visado queixava-se de ofensas à sua honra, um direito que faz parte dos chamados direitos de personalidade (que incluem, por exemplo, o direito ao bom nome e à reputação).
O caso vai para tribunal e então, como agora, o juiz vai ter de dirimir um conflito de direitos - entre o direito à liberdade de expressão do crítico e o direito à honra do ofendido.
Que ponderação vai o juiz atribuir a cada um destes direitos, e qual aquele que prevalecerá? Supondo um total de 10 pontos-importância a distribuir pelos dois direitos, quantos atribuirá o juiz ao direito à honra e quantos à liberdade de expressão?
Atribuiria 10 ao direito à honra e 0 ao direito à liberdade de expressão. No tempo de Salazar o direito à liberdade de expressão não existia porque a censura estava institucionalizada. Prevalecia o direito à honra que ganhava por 10-0 sobre o direito à liberdade de expressão. O réu seria condenado.
Era assim que o regime de Salazar calava os opositores. Nenhum outro crítico do regime ousaria repetir a proeza porque já sabia qual seria o seu destino. O respeitinho era muito bonito.
Maio de 2015, cinquenta anos mais tarde, o regime é democrático. Um crítico chega à televisão e diz que um alto dignitário do regime (*) é um politiqueiro e um jurista de vão-de-escada.
No dia seguinte, o crítico tem um processo por difamação. O visado queixa-se de ofensas à sua honra e acusa o crítico de difamação - e fá-lo porque certamente presume que o direito à honra prevalecerá sobre o direito à liberdade de expressão.
Um juiz é chamado a julgar o caso. Que ponderações vai ele agora atribuir a cada um destes direitos, e qual deles vai prevalecer na decisão?
Não é a resposta a esta questão que pretendo dar aqui, mas antes fazer uma constatação.
É a de que este alto dignitário do regime democrático, e o procurador do MP que deu seguimento à queixa, são dois verdadeiros fascistas, que é assim que as pessoas se referem na rua e no debate político a quem pensa e age como se estivesse no antigo regime.
(*) Na altura, o Paulo Rangel, além de eurodeputado, era vice-presidente do Partido que estava no Governo.
Maio de 1965, governava então Salazar. Um crítico chega à televisão e diz que um alto dignitário do regime então vigente é um politiqueiro e um jurista de vão-de-escada.
No dia seguinte, o crítico tinha um processo-crime por difamação. O visado queixava-se de ofensas à sua honra, um direito que faz parte dos chamados direitos de personalidade (que incluem, por exemplo, o direito ao bom nome e à reputação).
O caso vai para tribunal e então, como agora, o juiz vai ter de dirimir um conflito de direitos - entre o direito à liberdade de expressão do crítico e o direito à honra do ofendido.
Que ponderação vai o juiz atribuir a cada um destes direitos, e qual aquele que prevalecerá? Supondo um total de 10 pontos-importância a distribuir pelos dois direitos, quantos atribuirá o juiz ao direito à honra e quantos à liberdade de expressão?
Atribuiria 10 ao direito à honra e 0 ao direito à liberdade de expressão. No tempo de Salazar o direito à liberdade de expressão não existia porque a censura estava institucionalizada. Prevalecia o direito à honra que ganhava por 10-0 sobre o direito à liberdade de expressão. O réu seria condenado.
Era assim que o regime de Salazar calava os opositores. Nenhum outro crítico do regime ousaria repetir a proeza porque já sabia qual seria o seu destino. O respeitinho era muito bonito.
Maio de 2015, cinquenta anos mais tarde, o regime é democrático. Um crítico chega à televisão e diz que um alto dignitário do regime (*) é um politiqueiro e um jurista de vão-de-escada.
No dia seguinte, o crítico tem um processo por difamação. O visado queixa-se de ofensas à sua honra e acusa o crítico de difamação - e fá-lo porque certamente presume que o direito à honra prevalecerá sobre o direito à liberdade de expressão.
Um juiz é chamado a julgar o caso. Que ponderações vai ele agora atribuir a cada um destes direitos, e qual deles vai prevalecer na decisão?
Não é a resposta a esta questão que pretendo dar aqui, mas antes fazer uma constatação.
É a de que este alto dignitário do regime democrático, e o procurador do MP que deu seguimento à queixa, são dois verdadeiros fascistas, que é assim que as pessoas se referem na rua e no debate político a quem pensa e age como se estivesse no antigo regime.
(*) Na altura, o Paulo Rangel, além de eurodeputado, era vice-presidente do Partido que estava no Governo.
hereges
Um dos meus posts em baixo (este) tem um fim pedagógico. Tem em vista mostrar que existe uma longa tradição na cultura portuguesa que é adversa à liberdade de expressão em público, porque é quando se exprime em público que o herege é perfeitamente identificado e passa a constituir uma ameaça para os interesses estabelecidos. (A definição de heresia está aqui).
Esta tradição é profundamente antidemocrática porque a mãe da democracia moderna é precisamente a liberdade de expressão (pública), a qual tem primeiramente em vista contestar os interesses estabelecidos em nome do bem-comum mas que, na realidade, não são coincidentes com o bem-comum.
A liberdade de expressão é a condição sine qua non da democracia, significando que a democracia em Portugal não está assegurada enquanto o Ministério Público (que corresponde à antiga Inquisição) tiver os poderes que tem e, em particular, o poder para perseguir criminalmente os hereges.
Cristo foi um herege e foi condenado por isso, e o fundador da democracia moderna (Lutero) também.
É em relação com este tema que eu gostaria de voltar ao meu julgamento e àquele que considero ser o seu segundo momento mais importante. Foi quando o Dr. Nuno Botelho, ex-aluno do Dr. Paulo Rangel e presidente da Associação Comercial do Porto (ACP), na sua ânsia de exaltar as qualidades do "Professor" e da Cuatrecasas, disse em tribunal que a ACP recorria aos serviços da Cuatrecasas. Nesse momento, eu saltei no banco dos réus.
Quando pronunciei o meu comentário televisivo (Maio de 2015) eu sabia que o Paulo Rangel e o Avides Moreira (respectivamente, director e subdirector da Cuatrecasas) pertenciam à direcção da ACP, uma situação que ainda hoje se mantém. Mas era tudo, e não pensei mais no assunto, em parte porque não tinha a informação que o Nuno Botelho veio revelar em tribunal.
É caso para perguntar o que é que dois advogados, ambos directores da Cuatrecasas, sendo um deles também eurodeputado, fazem na direcção de uma associação de comerciantes. Em breve se chega à resposta.
Declarações do Dr. Nuno Botelho, em notícias e entrevistas que estão na internet, fazem concluir que a ACP se financia sobretudo através de fundos comunitários. A presunção é, pois, a de que o eurodeputado Paulo Rangel está na direcção da ACP para facilitar o acesso a esses fundos, tanto mais que a Cuatrecasas também possui um escritório em Bruxelas.
E será que ele se faz retribuir pela utilização que faz da sua condição pública de eurodeputado para obter benefícios para uma instituição privada, como é a ACP? Tudo indica que sim, sendo presumivelmente remunerado pelo lugar que ocupa na direcção da ACP.
Mas é precisamente agora que surge a parte mais chocante e que está relacionada com a revelação do Nuno Botelho em tribunal, e que é a seguinte: a ACP é cliente da Cuatrecasas.
O conflito de interesses é gigantesco - o fornecedor de serviços senta-se na direcção da instituição sua cliente. Como é que se decide na ACP a quem é entregue o fornecimento de serviços jurídicos? E como é decidido o preço a pagar por eles?
Mas isto não é sequer o mais importante. O mais importante é que se cria a presunção de que o Paulo Rangel se faz pagar a dois carrinhos - como director da ACP e depois também como director da Cuatrecasas - pelos serviços que presumivelmente presta à ACP no desempenho de uma função pública, como é a de eurodeputado.
Em suma, com uma elevadíssima probabilidade para não dizer certeza, uma parte dos fundos comunitários acaba no bolso do eurodeputado Paulo Rangel e da sociedade de advogados Cuatrecasas.
É para isto que a União Europeia atribui fundos a Portugal?
O magistrado X não viu aqui nenhum indício do crime de tráfico de influências, e ainda bem porque eu não tenho nenhum desejo de criminalizar o Paulo Rangel ou seja quem fôr.
O magistrado X estava demasiado concentrado no crime que eu cometi - o de não ter o devido respeito pelos políticos e pelos advogados do regime.
Como é que havia de ter com exemplos destes?
Um dos meus posts em baixo (este) tem um fim pedagógico. Tem em vista mostrar que existe uma longa tradição na cultura portuguesa que é adversa à liberdade de expressão em público, porque é quando se exprime em público que o herege é perfeitamente identificado e passa a constituir uma ameaça para os interesses estabelecidos. (A definição de heresia está aqui).
Esta tradição é profundamente antidemocrática porque a mãe da democracia moderna é precisamente a liberdade de expressão (pública), a qual tem primeiramente em vista contestar os interesses estabelecidos em nome do bem-comum mas que, na realidade, não são coincidentes com o bem-comum.
A liberdade de expressão é a condição sine qua non da democracia, significando que a democracia em Portugal não está assegurada enquanto o Ministério Público (que corresponde à antiga Inquisição) tiver os poderes que tem e, em particular, o poder para perseguir criminalmente os hereges.
Cristo foi um herege e foi condenado por isso, e o fundador da democracia moderna (Lutero) também.
É em relação com este tema que eu gostaria de voltar ao meu julgamento e àquele que considero ser o seu segundo momento mais importante. Foi quando o Dr. Nuno Botelho, ex-aluno do Dr. Paulo Rangel e presidente da Associação Comercial do Porto (ACP), na sua ânsia de exaltar as qualidades do "Professor" e da Cuatrecasas, disse em tribunal que a ACP recorria aos serviços da Cuatrecasas. Nesse momento, eu saltei no banco dos réus.
Quando pronunciei o meu comentário televisivo (Maio de 2015) eu sabia que o Paulo Rangel e o Avides Moreira (respectivamente, director e subdirector da Cuatrecasas) pertenciam à direcção da ACP, uma situação que ainda hoje se mantém. Mas era tudo, e não pensei mais no assunto, em parte porque não tinha a informação que o Nuno Botelho veio revelar em tribunal.
É caso para perguntar o que é que dois advogados, ambos directores da Cuatrecasas, sendo um deles também eurodeputado, fazem na direcção de uma associação de comerciantes. Em breve se chega à resposta.
Declarações do Dr. Nuno Botelho, em notícias e entrevistas que estão na internet, fazem concluir que a ACP se financia sobretudo através de fundos comunitários. A presunção é, pois, a de que o eurodeputado Paulo Rangel está na direcção da ACP para facilitar o acesso a esses fundos, tanto mais que a Cuatrecasas também possui um escritório em Bruxelas.
E será que ele se faz retribuir pela utilização que faz da sua condição pública de eurodeputado para obter benefícios para uma instituição privada, como é a ACP? Tudo indica que sim, sendo presumivelmente remunerado pelo lugar que ocupa na direcção da ACP.
Mas é precisamente agora que surge a parte mais chocante e que está relacionada com a revelação do Nuno Botelho em tribunal, e que é a seguinte: a ACP é cliente da Cuatrecasas.
O conflito de interesses é gigantesco - o fornecedor de serviços senta-se na direcção da instituição sua cliente. Como é que se decide na ACP a quem é entregue o fornecimento de serviços jurídicos? E como é decidido o preço a pagar por eles?
Mas isto não é sequer o mais importante. O mais importante é que se cria a presunção de que o Paulo Rangel se faz pagar a dois carrinhos - como director da ACP e depois também como director da Cuatrecasas - pelos serviços que presumivelmente presta à ACP no desempenho de uma função pública, como é a de eurodeputado.
Em suma, com uma elevadíssima probabilidade para não dizer certeza, uma parte dos fundos comunitários acaba no bolso do eurodeputado Paulo Rangel e da sociedade de advogados Cuatrecasas.
É para isto que a União Europeia atribui fundos a Portugal?
O magistrado X não viu aqui nenhum indício do crime de tráfico de influências, e ainda bem porque eu não tenho nenhum desejo de criminalizar o Paulo Rangel ou seja quem fôr.
O magistrado X estava demasiado concentrado no crime que eu cometi - o de não ter o devido respeito pelos políticos e pelos advogados do regime.
Como é que havia de ter com exemplos destes?
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