Na era das consequências
LUÍS NAVES
AP (imagem)
As alterações do clima devido à emissão de gases com efeito de estufa estão já bastante estudadas e há modelos que permitem fazer previsões com alguma segurança. Curiosamente, o que se conhece menos bem são os efeitos que isso poderá provocar nas sociedades humanas.
Um novo estudo, do Centro de Estudos Internacionais e Estratégicos (CSIS, na sigla em língua inglesa), permite desenhar três cenários planetários, à distância de uma geração. O trabalho parte de três aumentos de temperatura aceites nos modelos científicos e tenta identificar a respectiva evolução geopolítica, retirando lições de política externa e de segurança para os Estados Unidos.
O primeiro parágrafo do trabalho é de uma eloquência brilhante:
"Embora as consequências da mudança climática global pareçam matéria de Holywood - algum futuro distópico imaginário -, o derreter do gelo do Árctico, o crescimento dos desertos em África e a inundação das terras baixas são demasiado reais. Já vivemos numa 'Era das Consequências', que será cada vez mais definida pela intersecção das mudanças climáticas e a segurança das nações."
O primeiro cenário da organização independente americana considera um aumento de temperatura média de 1,3 graus centígrados. O ano é 2040. Em termos de segurança, este conjunto terá elevadas tensões fronteiriças provocadas por migrações de grandes grupos, escassez de recursos e doenças.
O segundo cenário, de 2,6 graus, também em 2040, agrava todas estas tendências. Segundo os autores, a própria coesão nacional dos países ficará em dúvida, devido a três factores: falta de água, escassez de alimentos e migrações em larga escala. Os conflitos serão motivados pelo domínio de recursos, tais como água.
O terceiro cenário, aqui definido como de catástrofe, parte de um aumento de 5,6 graus até 2100. Os autores do estudo não excluem o colapso de sociedades ou a guerra geral pelo controlo de território. A segurança das nações industrializadas estaria em grande perigo. Na comparação de um participante na discussão, citado no relatório, "um cenário Mad Max, só que mais quente, sem praias e talvez até maior caos".
Segundo os autores do estudo do CSIS, não há modelos que permitam saber com exactidão se estes acontecimentos ocorrerão mesmo, caso o aumento de temperatura global seja aquele, mas há trabalhos disponíveis sobre os efeitos do stress ambiental em sociedades humanas: os casos clássicos dos Maias ou da ilha da Páscoa, enunciados no livro de Jared Diamond, Colapse, são exemplos muito estudados.
Algumas projecções do CSIS são alarmantes. A de crescimento económico, por exemplo: com estimativas muito baixas de crescimento anual (de PIB e de população), os autores chegaram a um aumento de dez vezes nas emissões de dióxido de carbono em 2100, caso não haja novas fontes de energia. As fronteiras poderão ser dramaticamente alteradas. Em 2050, a Rússia terá 100 milhões de habitantes, um terço dos quais muçulmanos. A pressão da China e dos países vizinhos sobre o imenso território vazio será tremenda.
Os autores esperam terrorismo em larga escala, devido ao desespero de países com crescimentos demográficos insustentáveis. Haverá milhões em risco de fome, caso as colheitas falhem e um terço da população mundial terá falta de água.|
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